Notícias

Após um mês, caso de intoxicação por metanol mobiliza autoridades e revela esquema de falsificação de bebidas

Divulgação

Trinta dias após a divulgação dos primeiros nove casos de suspeita de intoxicação por metanol em bebidas alcoólicas, em 26 de setembro, uma série de ações coordenadas entre órgãos públicos em todo o país tenta conter o avanço da contaminação e punir os responsáveis pela falsificação dos produtos.

Desde o alerta inicial, emitido pelo Centro de Informação e Assistência Toxicológica (Ciatox) de Campinas (SP), e repassado à Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (Senad), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o país registrou 58 casos confirmados de intoxicação e 15 mortes — a maioria em São Paulo. Outros 50 casos seguem em investigação.

Origem da contaminação

As investigações apontam que o metanol foi introduzido nas bebidas falsificadas a partir do uso de álcool combustível adulterado, contendo altas concentrações da substância tóxica. A Polícia Científica de São Paulo confirmou, em 8 de outubro, que as amostras coletadas apresentavam níveis anormais de metanol, incompatíveis com o processo natural de destilação.

Pouco depois, uma operação da Polícia Civil de São Paulo localizou dois postos de combustíveis no ABC paulista que teriam comercializado o produto adulterado. Os agentes também chegaram a uma distribuidora clandestina de bebidas, onde eram envasados e distribuídos os destilados falsificados.

“O primeiro ciclo foi fechado. Vamos continuar as diligências para identificar a origem de todas as bebidas adulteradas no estado”, declarou o delegado-geral da Polícia Civil, Artur Dian.

Ações emergenciais e resposta nacional

Ainda em 7 de outubro, o governo federal criou um comitê de crise para coordenar as ações de combate ao problema. No mesmo dia, foi anunciada a segunda remessa de etanol farmacêutico aos hospitais-pólo e a aquisição do antídoto fomepizol, utilizado no tratamento de intoxicação por metanol.

Os Centros de Informação e Assistência Toxicológica (Ciatox) lideraram a rede de alerta, enquanto vigilâncias sanitárias, procons e polícias civis e militares atuaram em conjunto nos pontos de venda e consumo. Hospitais de referência foram estruturados até mesmo em estados sem casos confirmados, especialmente nas regiões Norte e Centro-Oeste.

Em São Paulo, o Instituto de Criminalística e o Laboratório de Toxicologia Analítica Forense (Latof) da USP, em Ribeirão Preto, desenvolveram novos protocolos de análise, reduzindo o tempo de testagem das amostras. Segundo a Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), o setor registrou queda de até 5% no consumo de bebidas no mês de setembro, reflexo direto do temor gerado pela crise.

Inovação e prevenção

Universidades também se mobilizaram para buscar soluções tecnológicas. Pesquisadores do Centro de Informática da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) criaram um “nariz eletrônico”, capaz de identificar a presença de metanol em bebidas com apenas uma gota de amostra.

“O nariz eletrônico transforma aromas em dados. Esses dados alimentam a inteligência artificial, que aprende a reconhecer a assinatura do cheiro de cada amostra”, explicou o professor Leandro Almeida, coordenador do projeto.

Próximos passos

Além das ações de saúde e segurança, o caso chegou ao poder legislativo. Em São Paulo, uma CPI sobre falsificação de bebidas deve iniciar os trabalhos nesta terça-feira (29), com depoimentos de autoridades estaduais. Já na Câmara dos Deputados, pode ser votado ainda nesta semana o Projeto de Lei 2307/07, que torna crime hediondo a adulteração de alimentos e bebidas.

O último boletim divulgado pelo Ministério da Saúde, na sexta-feira (24), informa que 635 notificações foram descartadas até o momento. Mesmo assim, o número de casos e mortes reforça a gravidade do episódio, considerado por especialistas como o maior surto de intoxicação por metanol da última década no Brasil.